A estreia de Portugal no Camel Trophy deu-se em 1983, na edição do Zaire. Juntamente com Pedro Vilas-Boas, Manuel Marques Pinto defendeu a bandeira nacional em todas as situações, incluindo quando o veículo onde seguiam se despistou e o obrigou a conduzir alguns dias com um tornozelo ligado e com dores.
Este é o seu testemunho, de uma participação numa aventura que não se esquece:
“O meu contacto com o Camel Trophy foi por mero acaso, ao comprar tabaco numa tabacaria de Campo de Ourique que tinha, no balcão, um prospecto de anúncio e convite à inscrição numa prova a realizar em 1983.
O amigo com quem tinha almoçado – o jornalista desportivo, ligado ao automobilismo há longa data, Augusto Vilela – entusiasmou-me dizendo que com a experiência de várias comissões em África e por fazer Todo-o-Terreno na caça, seria interessante concorrer. Creio que ele próprio tirou o prospecto e mo entregou, para preencher e enviar.
Enviei, e passadas umas semanas recebo um telefonema perguntando pela minha disponibilidade para dentro de alguns dias me deslocar às Canárias, onde se realizaria uma prova de selecção.
Confesso que a minha primeira impressão foi de que algum amigo estaria a brincar e, após a primeira surpresa, pedi à pessoa que se identificasse e me desse o seu número de telefone.
Confirmei que tudo era verdade e lá fui a uma reunião que, segundo creio, decorreu no Correio da Manhã para acertarem os pormenores e conhecer os outros sete seleccionados.
Na Gran Canária encontrámos os oito selecionados de Espanha numa prova realizada numa pista de provas onde o único obstáculo que achei dificil – dado o tempo de percurso ser primordial – foi uma descida íngreme a acabar em curva e ter de sair “alinhado” para uma travessia de ponte de duas traves sem guias.
Foram seleccionados quatro Portugueses e quatro Espanhóis. Fomos mais tarde fazer a segunda prova em Inglaterra, no campo de treino da Land Rover perto de Birmingham, e que serviria de ordenação final para efectivos e suplentes.
Mantive sempre o resultado tão confidencial quanto possível, para evitar as piadas de amigos, até que o Correio da Manhã começou a falar no assunto, promoveu um beberete de apresentação e aí lá tive de aturar as piadas dos amigos e as preocupações da famíla, principalmente por o Zaire (na altura) já não ser um território sem problemas de segurança.
Sobre a prova em si, cujo trajecto e percalços são mais ou menos conhecidos, como o incêndio de uma viatura de jornalistas, mantenho apenas na memória a dor que foi suportar guiar durante 2 ou 3 dias com o tornozelo esquerdo ligado, devido a uma queda numa noite de chuva tropical e terreno completamente enlameado. Graças às bisnagas de pomada que o médico me deu, e que eu ia aplicando sempre que podia, consegui acabar a prova fazendo os turnos que me competiam.
Lembro-me que fomos acompanhados no Zaire por um chefe de redacção do Correio da Manhã, e que esse jornal publicou quase todos os dias da prova uns artigos com fotos. Esse chefe de redacção do Correio da Manhã foi evacuado, ainda durante a prova, por motivos de saúde.
Como apreciação da prova, globalmente continuo a pensar que é extremamente difícil reunir num grupo tão heteregéneo um conjunto de homens que criaram uma empatia e solidariedade que se manifestou sempre, desde os pequenos pormenores às decisões tomadas durante a prova e até aquando da capotagem da nossa viatura.
Creio que as experiências vividas por outros participantes, e noutras provas, possam e devam ser diferentes. Contudo, em relação à expectativa que tinha ao iniciar, posso afirmar que a grande maioria deve ter acabado sem se sentir minimamente defraudado, e até com um sentimento de a realidade ter suplantado a expectativa inicial.
Termino, lamentando que não se possa realizar um Camel Trophy para Veteranos, pois com os meus actuais quase 67 anos ainda era capaz de me inscrever.”